Figura emblemática como poucas na história da Música Popular Brasileira, João Gilberto transformou a maneira de cantar e tocar violão no Brasil. Adorado por muitos, considerado gênio, desprezado por poucos, considerado excêntrico, é muito difícil ser indiferente a João Gilberto.
Nascido em Juazeiro (Bahia), em 10 de junho de 1934 João ganhou um violão aos 14 anos de idade, e nunca mais largou. Quando estava com 6 anos de idade, ia até a loja de discos apenas para ouvir música, desde Duke Ellington e Tommy Dorsey (grande parceiro de Frank Sinatra) até Dorival Caymmi, Anjos do Inferno e Dalva de Oliveira. Aos 18 anos foi para Salvador tentar a sorte como cantor de rádio e crooner. Logo depois seguiu para o Rio de Janeiro, onde atuou no conjunto vocal Garotos da Lua. A carreira no grupo durou menos de um ano. Cansados de seu comportamento pouco 'profissional' (atrasos, faltas constantes), os Garotos da Lua demitiram João Gilberto. Então ele ficou livre para conhecer outros músicos e teve algumas composições suas gravadas.
De todas as maneiras possíveis, ele é a síntese da Bossa Nova - voz, violão, tudo nele é único. Ele foi o que teve a maior influencia nos outros músicos que já apareciam na MPB - de Chico Buarque, Caetano, Gal, Gil e até Ney Matogrosso.
João é o que chamamos de Mago ou de Mito. Talvez o único que carrega o som em suas entranhas de tão apurado que tem o ouvido, de tão profundo conhecedor das notas musicais que ele é -não permite distorções, não suporta mixagens ou o "manuseio" barato dos engenheiros de som. Percebe qualquer semi-tom fora de lugar- perfeccionista, genial. É a nobreza verdadeira e em todos os sentidos da boa música e da nossa MPB. E com isso, podemos vivenciar a alegria de podermos saber que vivemos para ouvi-lo.
Com seu jeito tranqüilo aliado à um trabalho que é mesmo impecável, por onde ele passou criou histórias pitorescas, ninguém entendia como algum artista poderia ser 'tão difícil' quanto ele. É conhecida por todos a história do show em que ele dispensou a orquestra e exigiu que se desligasse o ar condicionado. Quem não entendeu chamou-o de maluco ou de chato. Só quem ama a verdadeira arte musical e sabe mesmo de sons e tudo o que envolve uma boa música, compreendeu ele.
Em 1958 gravou, pela Odeon, dois compactos que lançaram seu estilo e inauguraram o movimento Bossa Nova: "Chega de Saudade"/"Bim Bom" em julho, e "Desafinado" / "Oba-la-lá"
As características que mais o notabilizaram foram a maneira de cantar baixinho, saindo radicalmente da tradição dos grandes cantores do rádio, famosos por sua interpretação muito alta e seus "vozeirões", e a forma de tocar violão, adotando uma batida diferente, bem especial, que desloca o acento da tradicional batida de samba.
São famosas suas interpretações de "Aos Pés da Cruz" (Zé da Zilda/ Marino Pinto), "Samba de uma Nota Só" (Tom Jobim/ Newton Mendonça), "O Barquinho" (Menescal/ Bôscoli), "Samba da Minha Terra" e "Saudade da Bahia" (Dorival Caymmi), "Na Baixa do Sapateiro" (Ary Barroso), "Falsa Baiana" (Geraldo Pereira), "Isaura" (Herivelto Martins/ Roberto Roberti), todas recriações que se notabilizam por seu estilo único de interpretar.
Mais e para que serve tanta genialidade, musicalidade, se ninguém se preocupa, ninguém aprecia, ninguém liga para isso?, estaremos mesmo vivendo numa era de total banalidade?
Pois vejam: Estamos festejando 50 anos da aparecimento da Bossa Nova, e o mestre, criador, e convidado especial, estará ausente em todos os sentidos....
Os três primeiros discos dele: Chega de Saudade (1959), O amor, o sorriso e a flor (1960), e João Gilberto ( 1961) não foram lançados em CD ate hoje! Ao menos, não como haviam sido gravados originalmente... Por causa de uma longa, e ainda inconclusa pendenga judicial envolvendo o cantor e a Gravadora EMI. Esses Álbuns estão fora do Catálogo, fazendo que as novas gerações, nem tenham sequer a oportunidade de apreciar ele, de conhecer todas as nuances e meandros do nascimento da Bossa Nova.
São ao todo 39 canções que definiram a bossa nova, nos seus ‘bolachões’ originais de vinil. Enfim, peças raríssimas de historia de musica.. e nem apenas a nossa, senão da historia mundial da musica em geral.
Mais não é isso apenas, tudo veio de uma certa “coletânea” lançada pela EMI em 1988, intitulada “O Mito” e que reúne os três discos mencionados acima, porem de uma certa forma, aleatória, quase ditatorial imposta pela Gravadora EMI e que, desagradou ao Autor. Essa coletânea é o centro da discórdia entre João e a gravadora: JG não aprovou em nenhum momento a ‘remasterização’ feita das suas músicas gravadas entre 1959 e 1961. E que, foi feita a ‘revelia’ dele!..alterada mesmo... sem ele aprovar ou concordar em nada, logo ele! Dono e Autor das musicas... Aconteceu de tudo: a sonoridade musical foi alterada, pasmen!. Alterada por algum pseudo-engenheiro de som, Fizeram o que les deu na telha mesmo: alteraram a ordem das músicas (dá para imaginar, para um perfeccionista, isso é pior que sacrilégio), foram dispostas de qualquer maneira, totalmente fora de ordem. As capas trocadas por uma representação gráfica qualquer. E ate duas canções dele, que foram interpretada por João no Filme Orfeu no Carnaval, acabaram reunidas, sim assim mesmo, vocês entenderam certo: duas musicas viraram uma só, numa única faixa.... e por ai vai! Tudo feito sem a autorização dele, e que, nem sequer foi colocado para ele considerar, antes de serem lançadas nas Lojas...coisas da gravadora EMI Odeon!
No processo que João impetrou contra a Gravadora, três Laudos Técnicos comprovaram que a tal ‘remasterizaçao’ alterou os Álbuns originais. Apontando desequilibro de mixagem, abuso da equalização e outros tais como “efeitos especiais reberverativos" na transição da primeira versão, para a segunda. Uma dessas análises chega a acusar erros grosseiros, tal como colocar “eco” sobre uma faixa, com bateria e ritmo..já mixada...!
Porem o samba do criolo doido da Gravadora EMI no termina ai: pois alm de remasterizaçao mal feita, há os direitos do Autor e os “Royalties”. Na época a EMI ofereceu 1,5%, que era o que constava no primeiro contrato do músico e autor (contrato de mais de 30 anos atrás). Sejam sinceros, houve ou não houve mã fé nessa tratativa toda? E, apesar da recusa do Autor em aceitar todas essas sandices, a gravadora decidiu, assim mesmo, lançar a coletânea.
Desta maneira o Autor procurou a Justiça, não apenas para pedir Danos Morais, como a proibição definitiva da produção e venda por parte da EMI, e como também a retirada de todos os exemplares já produzidos pela gravadora.
A questão chegou ate ao STJ o Supremo Tribunal de Justiça onde os Ministros da Terceira Turma, reconheceram o prejuízo á obra em relação a qualidade da mesma. Porem também consideraram que “não houve prejuízos em relação á qualidade” da obra, ainda consideraram que não houve “alterações perceptíveis ao senso comum”... OU SEJA: em bom português: coisa de ministros que estão acostumados o ouvir Pagode, o disco das Escolas de Samba do Grupo I do Rio, Tati Quebra-Barraco e ate Mc Marcinho! ... ..!!! Mostrando uma total falta de sensibilidade artística e musical. Coisa de surdos mesmo!
Não é a toa que a Gravadora EMI está no último lugar no Ranking das empresas de fonografia, tampouco é a toa que este ano foi trocado o Presidente da EMI, por práticas abusivas e por não saber preservar a ‘prata da casa’..pois a maioria dos bons músicos estão migrando apressadamente para outras gravadoras.
Bacana!
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